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Quando a maré encher
O óbvio ululante ‘para inglês, alemão, iraniano e japonês ver’

Pois é, todo mundo sabe que na semana passada algumas UPP tiveram problemas. A de Manguinhos foi incendiada. Que maravilha, que sensação de segurança boa né não? Viva o Rio de Janeiro, que continua lindo, do Leme ao Pontal, sem esquecer de Realengo.

Por conta dos tais ataques, um teatro de guerra está sendo armado. Mais uma vez, uma simples ação de marketing. Vem aí o Exército, a Polícia Federal, Bope, Polícia Rodoviária Federal, se bobear até os escoteiros. Vão invadir e ocupar o complexo de favelas da Maré, ó que beleza. Por tempo indeterminado. Exército com poder de polícia, com direito a efetuar prisões e até invadir casas para procurar coisas e gentes suspeitas.

E daí? Daí que o problema básico de sempre: com tudo anunciado com essa antecedência toda, quem tem que correr de lá já ligou pra Lusitana. Até sexta-feira, no máximo, os caminhões de mudança estacionam por lá pra levar a turma e suas coisas para nem tão longe dali.

E alguém será preso? Só (se for o caso) os cafés pequenos de praxe, porque quem manda na bagaça vai dar no pé. Aí, quando terminar a Copa, pouco depois, tudo volta ao normal. Uma nova UPP será instalada e, em pouco tempo, as coisas estarão todas em seu devido lugar. Uma facção aqui, outra ali, a milícia acolá.

Quem presta serviço pra esses caras, quem vive com medo e sob o jugo da turma, não precisa da presença deles pra sentir medo. Basta saber que estão todos soltos (ou só vivos, mesmo que presos) e sabendo de tudo o que acontece, pra continuar com medo, não desobedecer nem entregar ninguém. Porque sabem que tudo voltará ao normal e, se e quem sair da linha, será devidamente penalizado.

Ou seja, nada vai mudar de verdade.

Porque pra mudar de verdade é preciso aceitar tocar em certos assuntos, desmistificar tabus. É impossível resolver favela (qualquer uma) sem falar em remoções e reurbanizações. Se é verdade que a favela não devia existir, também é verdade que já não dá – há muito tempo – para extingui-las. É preciso acabar com suas estruturas atuais, de becos e vielas e barracos e ajuntamentos. É preciso transformar tudo em bairro, com ruas, casas e pequenos prédios, instalações elétricas e água e esgoto etc etc etc., a tão famosa presença do estado que está em todos os discursos mas não passa disso.

Se até o Beltrame – Mariano, o jênio – sabe disso, por quê não acontece? No fundo, no fundo, é elementar meus caros Watsons.

Quando acabar a Copa e nossos ilustres visitantes derem no pé, as tropas serão guardadas à espera do próximo conflito ou até faltar três ou quatro meses para as Olimpíadas. E depois, nada novo. Mas tudo de novo.