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De Octavio Ianni a Dilma Roussef: a função do Príncipe Eletrônico
Quando a presidente Dilma Roussef fez o pronunciamento oficial para todo o país respondendo às reivindicações ocorridas  nas manifestações e protestos de junho e julho do ano passado simultaneamente surgiu na minha mente o texto escrito pelo sociólogo Octavio Ianni (1926-2004), intitulado “O Príncipe Eletrônico”. Nele, Ianni analisa como teoria e prática as características d’O Príncipe, de Maquiavel, e o Moderno Príncipe, de Gramsci, apontando o surgimento de um novo príncipe no final do século XX, o Príncipe Eletrônico.

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Quando a presidente Dilma Roussef fez o pronunciamento oficial para todo o país respondendo às reivindicações ocorridas nas manifestações e protestos de junho e julho do ano passado simultaneamente surgiu na minha mente o texto escrito pelo sociólogo Octavio Ianni (1926-2004), intitulado “O Príncipe Eletrônico”. Nele, Ianni analisa como teoria e prática as características d’O Príncipe, de Maquiavel, e o Moderno Príncipe, de Gramsci, apontando o surgimento de um novo príncipe no final do século XX, o Príncipe Eletrônico.

“Sim, o “príncipe” tem sido uma figura importante na teoria e prática da Política. Sob diferentes denominações e adquirindo distintas figurações, aparece em toda a história dos tempos modernos”.

Segundo Ianni, as práticas e teorias dos “príncipes” de Maquiavel e Gramsci entram em crise, pois se tratando do novo contexto histórico e social do fim do século XX, bem como da globalização o Príncipe Eletrônico toma a dianteira no quesito de estar inserido aos novo mecanismos deste período, como a informática e cibernética. No entanto, Ianni ressalta que os príncipes de Maquiavel e Gramsci não perdem sua essência e importância em relação a Hegemonia e Soberania.

De acordo com a análise do sociólogo, o príncipe atual está incluído no mundo globalizado, é mais orgânico, presente em todo lugar do mundo

O pronunciamento oficial da presidente Dilma Rousseff sobre as manifestações (21/06/2013)n

O pronunciamento oficial da presidente Dilma Rousseff sobre as manifestações (21/06/2013)

por meio de jornais, revistas, televisão e mais recente a internet: “Nessa época, as tecnologias, informáticas e cibernéticas impregnam crescente e generalizam todas as esferas da sociedade nacional e mundial”, sendo assim “Esse poder ser o clima em que de forma, impõe e sobrepõe O Príncipe Eletrônico, sem o qual seria difícil compreender a teoria e a prática da Política na época da globalização”.

Desse modo, Ianni aponta que o poder da imprensa se torna importante para divulgar “tudo o que se refere à Política”, desafiando as práticas do poder público, em que o governante é obrigado a prestar satisfações sobre seu governo para as massas por meio das tecnologias de informação. Não somente ao quarto poder o político necessita fornecer seu trabalho de gestão, Ianni destaca o papel dos sindicatos, movimentos sociais e de outros partidos políticos sobre a atuação da Política vigente: “Na época da globalização, modificam-se mais ou menos radicalmente as condições sob as quais desenvolve-se a teoria e a prática da Política”.

No texto, Ianni informa que o surgimento das tecnologias para a divulgação de notícias é de alcance mundial, ou seja, qualquer informação de um governante em um determinado Estado, situado em certa cultura, não é mais fornecida para somente um espaço e sociedade, ela ultrapassa fronteira e abrange o todo o planeta, sendo de extrema importância o político moderno estar preparado para administrar sua figura pública e o dinamismo que a informação sobre sua pessoa pode alcançar.

“Alteram-se as formas de sociabilidade e os jogos das forças sociais, no âmbito de uma vasta, complexa e contraditória sociedade civil mundial em formação. Isto significa a emergência e dinâmica de grupos sociais, estruturas de poder, acomodações, tensões e lutas em escala mundial. […] No bojo desse mesmo processo de globalização, política-econômica e sócio-cultural, desenvolvem-se tecnologias eletrônicas, informática e cibernética, que agilizam, intensificam e generalizam as articulações, as integrações, as tensões, os antagonismo, as fragmentações e as mudanças sócio-culturais e político econômicas, pelos quatro cantos do mundo”.

No entanto, o Príncipe Eletrônico é uma figura que está presente no nosso dia a dia por meia da mídia, sendo que esta articula sua informação nas matérias de acordo com o seu formato ideológico. A imprensa pode modelar o político como sendo uma figura de boa conduta ou corrupta, bem como pressionar uma declaração pública sobre algum fato importante em que o nome do político esteja envolvido. Nesta questão, a soberania e hegemonia do político não serão mais de relevância no mundo globalizado e confrontando os tantos blocos de poderes e intelectuais que analisam e comentam sua atitude política:

“O Príncipe Eletrônico é entidade nebulosa e ativa, presente e invisível, predominante e ubíqua, permeando continuamente todos os níveis da sociedade, em âmbito local, nacional, regional e mundial […] Além da competição evidente ou implícita entre os meios de comunicação de massas, ocorrem frequente irupções de fatos, situações, relatos, análises, interpretações e fabulações que pluralizam e democratizam a mídia […] Há jornais, revistas, livros, rádios, televisões e outros meios que expressam formas e visões alternativas do que vai pelo mundo”.

O POLÍTICO E O ELETRÔNICO

Voltando ao pronunciamento da presidente Dilma Rousseff sobre as manifestações de junho e julho do ano passado e depois de uma pequena análise do texto de Octavio Ianni, nota-se que o poder da mídia e, principalmente, dos movimentos sociais que lotaram as ruas nesse período, possibilitou o discurso em rede nacional de seu governante para prestar contas e responder às reivindicações da população. Isto sim é uma medida positiva para as milhares de pessoas que caminharam no asfalto em busca de soluções, não sendo apenas pelo o inicial motiva dos vinte centavos.

Denuncia de espionagem dos EUA feita pelo ex-agente da NSA, Edward Snowdenn

Denuncia de espionagem dos EUA feita pelo ex-agente da NSA, Edward Snowden

Não só o pronunciamento da Dilma foi pressionado pela mídia, percebe-se nos últimos anos o poder da imprensa que culminou no fornecimento

Suposta traição do presidente da França, François Hollanden

Suposta traição do presidente da França, François Hollande

de denúncias que mudaram as relações de poder entre nações, bem como de quebra de leis mundiais, caso recente de espionagem norte-americana no governo de Barack Obama, denunciado via imprensa pelo ex-agente da NSA, Edward Snowden. Outro aspecto é o presidente da França, François Hollande, ser forçado a explicar a revelação de suposto envolvimento de traição conjugal à mídia. Não precisa ir muito longe, em São Carlos a pressão da mídia e dos munícipes em relação a compra de uniformes escolares pela Prefeitura, fez com que o prefeito venha a público e explique o exorbitante preço dos uniformes pelo Executivo.

Muitos pesquisadores apontam que o surgimento do Príncipe Eletrônico ocorreu em 1997, com a morte da princesa Diana. Este fato comoveu a população britânica, a imprensa colocou o reinado de Elizabeth II em xeque, tendo o embate entre o Parlamento e a Monarquia, assim como anunciando aos leitores quem é o inimigo e o bonzinho em torno da tragédia que culminou com a morte da “Princesa do Povo”. Este contexto que mexeu com o Reino Unido foi muito bem retratado no filme “A Rainha”, lançado em 2006.

Ainda citando Ianni, a imprensa tem o poder de controlar os fatos, redigindo inimigos, instaurando nos textos uma determinada ideologia, formadora de mentes, de modo a gerar mais capital de lucro com a circulação de suas edições, porém na época em que o pensamento foi exposto no texto, Ianni apontou sendo a televisão o principal objeto estético, mas sabemos que atualmente a internet sobressai os demais:

“No âmbito da mídia em geral, enquanto uma poderosa técnica social, sobressai a televisão. Trata-se de um meio de comunicação, informação e propaganda presente e ativo no cotidiano de uns e outros, indivíduos e coletividades, em todo o mundo. Registra e interpreta, seleciona e enfatiza, esquece e sataniza o que poderia ser a realidade e o imaginário. [A imprensa] Muitas vezes transforma a realidade, seja em algo encantado seja em algo escatológico, em geral virtualizando a realidade, em tal escala que o real aparece como forma espúria do virtual”.

Uma das tantas manifestações ocorridas em junho e julho de 2013. Destaque para a tomada do Congresso em Brasílian

Uma das tantas manifestações ocorridas em junho e julho de 2013. Destaque para a tomada do Congresso em Brasília

Atualmente, o Político precisa estar disposto a responder questionamento que envolva sua gestão e prestar contas em relação a seu governo para a população, partidos, sindicatos e imprensa. A hegemonia está cada vez em crise quando esta geração vivenciando um mundo dinâmico, em que a informação, seja de veracidade pura seja enfeitada visando intrigas, ultrapassa as barreiras da soberania política. O Príncipe Eletrônico, segundo Ianni, é um “intelectual orgânico coletivo”, ou seja, tem que formular seu discurso para as diversas categorias e classes a quem se faz ser escutado. Nota-se o político cada vez mais próximo de seu eleitor por meio das redes sociais, compartilhando suas ideias e opiniões sobre os diversos fatos políticos, obtendo resposta de seus leitores de forma imediata, bem como repercutindo uma enorme massa populacional.

“Essa é uma larga medida, a fábrica de hegemonia e da soberania, que teriam sido prerrogativas do Príncipe de Maquiavel e do Moderno Príncipe de Gramsci. Agora é o Príncipe Eletrônico que detém a faculdade de trabalhar a hegemonia e a soberania; ou o problema e a solução, a crise e a salvação, o exorcismo e a sublimação”.

No entanto, Dilma e outros governantes vão ter que responder as diversas reivindicações e manifestações que caminham em questões mais aprofundadas, sendo na persona do político a importância de articular com esses movimentos sociais. Chegamos ao ponto que é necessário utilizar do mecanismo de pressão popular a nossos dirigentes para o atendimento das reivindicações, e na Copa de 2014 se não atenderem as demandas da nação, novamente as ruas se farão ouvir. E isso não é uma profecia.

Jorge Filholini