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A corrida espacial, a Guerra do Vietnã, nos conflitos na Argélia que questionavam profundamente o colonialismo nfrancês e a Revolução Cubana, que nascia como uma alternativa nantimperialista. Todo esse quadro acentuado por uma polarização mundial npela Guerra Fria. Esse era o cenário mundial em 1960, ano em que o nfilósofo francês Jean-Paul Sartre, acompanhado de sua companheira, a nromancista e também filosofa Simone de Beauvoir e do escritor Jorge nAmado, visitou a então provinciana cidade de Araraquara, com cerca de 80n mil habitantes na época, no dia 04 de setembro.
Foi um domingo de atenções divididas na ncidade, a Ferroviária, time de futebol araraquarense, enfrentava e nvencia o Santos de Pelé por 4 a 0 na Fonte Luminosa, estádio da cidade. nAinda assim, os ânimos da partida não foram suficientes para encobrir o nburburinho causado pela visita dos filósofos franceses. Na ocasião, nparticiparam de dois eventos na cidade: o primeiro organizado por nestudantes da então Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras (FFCL), nrealizado no Teatro Municipal – um encontro entre estudantes e ntrabalhadores rurais – e o segundo, realizado na própria faculdade, onden Sartre discorreu por um longo tempo sobre filosofia para um seleto npúblico. Na plateia, nomes como o do crítico literário Antonio Candido, on filósofo Bento Prado Jr., o dramaturgo José Celso Martinez, o filósofo ntambém francês Michel Debrun, o sociólogo e ex-presidente do país, nFernando Henrique Cardoso e sua esposa, a também socióloga Ruth Cardoso.
O responsável pela visita de Sartre e nSimone à cidade foi o filósofo Fausto Castilho, então docente do FFCL. nSartre, que tinha vindo ao Brasil a convite de Jorge Amado e passaria ncerca de dois meses em terras tupiniquins, sob o pretexto de participar ndo I Congresso Brasileiro de Crítica e História Literária, em Recife, nfoi contatado por Castilho que enviou ao filósofo uma pergunta sobre a nconciliação do existencialismo e marxismo, argumentação exposta na obra Crítica da Razão Dialética,n que havia sido publicada naquele mesmo ano. Após contato telefônico, nSartre afirmou que somente poderia responder àquela indagação npessoalmente e assim surgiu o convite para a conferência, que foi nimediatamente aceito. Apesar dos pretextos de participação em congressosn e conferências, ao que tudo indica, a visita de Sartre e Simone ao paísn era na verdade uma fuga das perseguições por eles sofridas, devido à nforte oposição que faziam ao colonialismo francês na Argélia.
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Apesar da prontidão do filósofo em naceitar o convite, Simone de Beauvoir e Jorge Amado não viam com bons nolhos a visita do companheiro, então no auge de sua popularidade, para nrealizar uma conferência em uma faculdade que era ainda criança (apenas 2n anos de existência), no até então pouco conhecido interior paulista. nMesmo assim, o trio acabou comparecendo ao evento. A viagem da capital naté a cidade foi realizada por uma Kombi cedida pelo FFCL e os três nforam hospedados na fazenda Conceição do Barreiro, propriedade da nfamília Mesquita, dona do jornal O Estado de S. Paulo. O jornal, nque cobriu toda a visita de Sartre ao país, ainda apoiava a Revolução nCubana e o posicionamento do filósofo, pelo simples fato de Fidel nCastro, à época, ainda não ter declarado Cuba como país comunista.
Não seriam apenas os jornais – nprincipalmente com os vindouros tempos da ditadura militar – que ntemeriam e repudiariam o ideário comunista, a Igreja Católica nararaquarense ficou aterrorizada com a visita do filósofo. Devido a sua nforte ligação com a esquerda, Sartre foi pauta da rádio da cidade, que ntransmitiu uma série de pregações promovidas pela Igreja – e produzidas npor conta do que a instituição religiosa chamava de “a ameaça comunista”n – contra o filósofo.
A palestra de Sartre na cidade, napresentada para cerca de 100 pessoas, ficou conhecida como “Conferêncian de Araraquara”. Nela o filósofo realizou considerações sobre algumas ndas colocações que fez em Crítica da Razão Dialética e também nrespondeu, por fim, à indagação feita pelo professor Castilho. nPosteriormente a palestra acabou sendo publicada como livro, sob o ntítulo de Sartre no Brasil – A conferência de Araraquara, numa parceria entre as editoras UNESP e Paz e Terra.